Organizações e tratado ou convenções internacionais exercem uma crescente influência na regulamentação das sociedades, tutelando os estados nacionais. A ONU com os seus institutos como a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) e a Unesco (Organização da Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) são exemplos do controle aludido. Até os uniformes das polícias começam a seguir um modelo sugerido pela ONU. São “apenas” sugestões? Podem ser. Mas exercem uma pressão política e reforçam certas tendências na competição interna entre líderes e partidos.
Os tratados e convenções também representam, até mais claramente, uma forma de tutela. O TPI (Tribunal Penal Internacional) e, no âmbito da América Latina, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) são exemplos de regulamentação a que os estados nacionais estão ficando subordinados. Pode-se objetar que a adesão a tais acordos é um ato soberano de cada Estado. É significativo, todavia, que os EUA e o Canadá não são signatários da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, o que sugere um sentido de tutela sobre os subdesenvolvidos. Os mais desenvolvidos dizem não à ingerência nos seus assuntos internos.
O TPI prendeu, julgou e condenou líderes e comandantes responsáveis por crimes de guerra ou contra a humanidade. Todos, porém, originários de países econômica e militarmente fracos. A violência contra tibetanos e iugures, por parte da China; contra curdos na Turquia; ou o bombardeio de populações civis na Chechênia, por parte da Rússia, são ignorados pelo TPI, assim como o patrocínio de terrorismo pelo Irã e o Paquistão. A tutela “do bem” é seletiva. O Poder militar (ai dos fracos!) e a importância econômica são suas balizas. A semelhança com o neocolonialismo não é coincidência.
O pretexto já não é o fardo do homem branco (obra de Joseph Ruyard Kipling, 1865 – 1936), a missão histórica de civilizar os povos selvagens. A nobre missão civilizadora foi exercida com enorme violência contra povos mais civilizados que os europeus da mesma época, como incas e chineses, sempre satisfazendo interesses econômicos e geopolíticos dos “civilizadores”. Agora é a defesa dos direitos humanos e a salvação do planeta!
Historicamente as grandes torpezas foram feitas em nome dos mais altos valores morais. Coincidindo sempre com interesses eleitorais, econômicos e geopolíticos. Os invasores portugueses derrotaram os índios aliando-se a alguns deles contra outros. A “tutela do bem” (neocolonialismo) mais uma vez encontra apoio nas divisões internas das nações vulneráveis.
A história se repetindo. Os motivos nobres são em parte verdadeiros. Crimes de guerra, violência contra grupos étnicos e destruição da natureza não precisam ser inventados e podem ocultar propósitos inconfessáveis. Exercem fascínio sobre aqueles que tanto exploram o nacionalismo como defendem a tutela internacional, conforme sirva aos seus objetivos políticos. Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) dizia: não é importante ter virtude, mas aparentar virtude.
O fortalecimento de poderes supranacionais, que além dos organismos e convenções citados incluem empresas poderosas, principalmente da área das novas tecnologias, ameaçam claramente a soberania dos estados nacionais e a democracia. Usam pretextos para legitimar controles. Um governo mundial tornou-se uma possibilidade real. Depende apenas da formação de um condomínio de três ou quatro centros de poder. Necessariamente ditatorial. Criminalidade, terrorismo, guerras, defesa do planeta e de grupos identitários formam um conjunto de grande apelo.
Rui Martinho Rodrigues
Doutor em História pela UFPE
Professor na UFC
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